quinta-feira, 23 de junho de 2011

"Quem nunca sofreu por amor nunca aprenderá a amar.
Amar é o terror de perder o outro, é o medo do silêncio e do quarto deserto, de tudo o que se pensa sem poder falar, do que se murmura a sós sem ter a quem dizer em voz alta.
É preciso sentir esse terror para saber o que é amar. E, quando tudo enfim desaba, quando o outro partiu e deixou atrás de si o silêncio e o quarto deserto, por entre os escombros e a humilhação de uma felicidade desfeita, resta o orgulho de saber que se amou.
Esse íntimo orgulho jamais lhe passaria: ela amara, dera tudo de si ao homem por quem se apaixonara na flor da sua juventude, tivera dele dois filhos, esperara-o sempre, para além de tudo. Cumprira a sua parte. Depois, a dor da sua perda atingiu-a como uma lâmina afiada, que trespassou coração, nervos, músculos. Por muito tempo, ficou ali cravada, uma dor aguda e sempre presente, uma ferida suja e porosa onde se misturavam o sofrimento e a raiva, o despeito e a vergonha, esse grito eternamente sufocado na garganta."

Rio das Flores
Miguel Sousa Tavares

Nenhum comentário: